quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Fim dos Tempos Para o Indiano?

Aproveitando o lançamento em DVD de Fim dos Tempos, uma crítica do filme como sempre acompanhada de uma recapitulação da carreira de seu diretor M. Night Shyamalan.


Quando O Sexto Sentido estreou em 1999 e pouco depois se tornou um dos filmes de terror/suspense mais lucrativos da história, o diretor indiano M. Night Shyamalan foi considerado um dos cineastas mais promissores de sua geração. Assim como era chamado de “novo Spielberg” pelo sucesso comercial que fez, também era comparado com Hitchcock, pela similaridade com as técnicas do “mestre do suspense” e a profundidade da história do menino que via gente morta. Ou seja, era um fenômeno de público e crítica como há muito não se via.



Seu primeiro longa após o sucesso de O Sexto Sentido foi muito aguardado, mas os fãs estranharam quando souberam que apesar de ter repetido a dobradinha com Bruce Willis (que conseguira uma inesperada fama como ator “sério”) o que prometia ser o novo sucesso de Shyamalan era uma história sobre super-heróis. Importante dizer que até então filmes de super-herói não eram sinônimos de bilheteria: X-Men estreava naquele mesmo ano. Obviamente Corpo Fechado não teve nem metade da repercussão de O Sexto Sentido e desagradou uma legião de fãs que esperava outro filme de terror.

Apesar do faturamento menor, Corpo Fechado adquiriu uma adoração por parte do público (alguns se arriscam a dizer que é o melhor filme de super-heróis já feito) que agora não era mais fã de O Sexto Sentido, mas sim de Shyamalan. Novamente o público não encarou bem quando descobriram que Sinais abordaria uma invasão alienígena à Terra. A crítica, que tinha gostado do filme de fantasmas, mas não do de super-herói, não entendeu a trama de aliens e muito menos como o filme conseguiu números tão bons quanto O Sexto Sentido.

Depois de Sinais, Shyamalan, já com um público consideravelmente fiel, apostou em uma história mais intimista sobre moradores de uma vila que são aterrorizados por estranhos seres. Apesar do grande marketing, A Vila foi considerado um fracasso, mas como sempre foi bem recebido entre os fiéis do indiano que já notavam um padrão nos seus filmes. O diretor, a exemplo de Hitchcock, sempre fazia uma participação como um personagem secundário, sempre atuava também como roteirista e produtor, a trama extraordinária (fantasmas, super-heróis, aliens, monstros) era somente um truque para entreter o expectador enquanto os dilemas dos personagens eram explorados, sempre havia uma abordagem religiosa, o uso da água como símbolo de fraqueza, a Filadélfia como pano de fundo para a história, e principalmente, sempre há uma reviravolta no final que nos deixa pensando: “Como eu não percebi isso?”.

Nada mais inesperado então que, vindo de um fracasso comercial por fazer uma trama intimista demais para o grande público, ele decida ir mais além e produzir um filme sobre contos de fadas. E, pela primeira vez, até o seu público fiel o questionou. A Dama na Água tem problemas, mas é inegavelmente uma obra com a assinatura do indiano onde ele usa boa parte dos elementos que o tornaram famoso: a água, a trama extraordinária, etc. Porém, desta vez, decide deixar de lado a reviravolta final e fecha seu filme de maneira bastante previsível. Alguns fãs até criaram alguma simpatia com a história, mesmo não havendo a tal reviravolta, e outros se conformaram com o fato de que, na pior hipótese, Shyamalan tinha errado uma em cinco, o que não representava nenhum declínio em sua carreira.

Fim dos Tempos


E então veio Fim dos Tempos, o novo filme que aborda um evento (no original The Happening, que significa “O Acontecimento”, mas que alguém achou muito difícil de traduzir) que afeta a costa leste dos Estados Unidos, e faz com que as pessoas comecem a se suicidar. Da enorme lista de elementos que sempre se fazem presentes nos seus filmes, poucos são usados, como a cena-chave passada no porão (que também acontece em todos seus filmes desde O Sexto Sentido) e a história passada na Filadélfia. O grande problema é que eles param por aí e Shyamalan erra feio se acha que não precisa deles em seus filmes. Neste ele nem sequer dá as caras, somente fala uma palavra ao telefone interpretando um personagem que é bastante comentado durante o filme, entretanto se mostra sem a menor importância, como boa parte do elenco.

Outro ponto que divide fãs é a mudança de atitude do diretor em se empenhar mais em chocar o expectador com os bizarros suicídios provocados pelo evento do que em explorar o casal que protagoniza o filme, que é muito mal interpretado, aprofundado e nada carismático, em uma história que precisa que o público torça pelos personagens. Estranho que o mesmo Shyamalan tenha feito exatamente o oposto em Sinais, que divide muitas similaridades com Fim dos Tempos, mas com o qual não há sequer comparações no que diz respeito à qualidade.

Por fim fica a impressão de que o antes chamado “novo Hitchcock” está perdendo a mão, uma perda irreparável para o cinema. Alguns indícios parecem dizer que Shyamalan estaria seguindo a onda ecologicamente correta que afetou Hollywood assim como o evento que afetou os personagens de Fim dos Tempos, e esta seria a razão para a realização deste filme, que tenta (e não consegue) alertar a população sobre os efeitos dos nossos atos na natureza. Porém parece estranho que seus três últimos filmes sejam considerados seus três piores e que haja uma queda de qualidade bruta entre A Dama na Água e Fim dos Tempos. Só resta torcer para que o promissor Manoj Shyamalan consiga se redimir em The Last Airbender, seu próximo projeto, anunciado para 2010, e que, tal qual em seus melhores filmes, haja uma grande reviravolta na carreira do indiano.

por Stefano Pfitscher

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